Pós-graduação é trabalho!
19/08/2020Por Luciano Rocha
Em 2019 assistimos a uma série de protestos contra os cortes na educação, promovidos pelo governo Bolsonaro, que atingiram diretamente os programas de pós-graduação das universidades brasileiras. O CNPq teve o menor orçamento desde 2010 e a CAPES cortou cerca de 8 mil bolsas, inviabilizando pesquisas e destinando pós-graduandos ao desemprego. Este cenário de desmonte continua em 2020, ainda que ofuscado pela crise sanitária que vivemos. É desanimador para os pesquisadores ver que essas medidas encontram algum apoio na sociedade. No entanto, é preciso entender que esse é apenas um sintoma de um projeto político-econômico que não reconhece a pós-graduação como um trabalho.
95% da produção científica no Brasil é feita em universidades públicas, sendo 80% realizada por pós-graduandos. Assim, os pós-graduandos formam a massa de trabalho que atua em ciência e tecnologia. Olhando por esta perspectiva, fica claro o quão absurdo é o fato de metade desses pesquisadores não receberem salário. Estamos falando, portanto, de um trabalho de excelência não remunerado. Quando pago, o salário desses trabalhadores é comumente chamado de “bolsa”. Mas veja que, em geral, usamos o termo “bolsa” para falar de uma ajuda financeira para pessoas vulneráveis sem cobrar grandes contrapartidas, e esse definitivamente não é o caso. Quando o salário não é visto como salário, ele parece um favor facultativo.
As duas maiores agências de fomento de pesquisa são as federais CNPq e CAPES, que não reajustam os valores pagos aos pesquisadores desde abril de 2013, nem mesmo para corrigir a inflação. Para ter-se uma ideia, na época o salário mínimo era de R$678,00. Isso representa uma desvalorização de 40% no salário de pós-graduandos no período. Mesmo assim, é exigida dedicação exclusiva dos bolsistas. Isto é, mesmo com um salário extremamente defasado, é vedada a busca por uma forma de complementá-lo, como fazem muitos brasileiros que possuem seus salários igualmente defasados.
Quando o trabalho não é visto como trabalho, direitos trabalhistas parecem indevidos. Deste modo, o pós-graduando não possui direito a férias, 13º salário, FGTS, afastamento por doenças ou mesmo contribuição para a previdência social. A licença-maternidade só foi regulamentada pela CAPES em 2018 e a licença-paternidade não existe.
Ainda assim, o Brasil está na 13ª posição em produção científica global, em um ranking com 190 países. Isso deve-se em grande parte aos pós-graduandos que, mesmo tão desvalorizados e enfrentando um ambiente hostil, conseguem dar prosseguimento ao desenvolvimento científico do país.
A pós-graduação é um trabalho e precisa ser visto como tal. É um passo imprescindível para que o nosso país tenha um sólido programa de desenvolvimento científico e tecnológico. Pós-graduandos do Brasil, uni-vos!
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