Projeto de Lei efetiva gestão privada de equipamento voltado à proteção de mulheres em São Carlos
02/11/2024Matéria em colaboração com o Em Defesa do Comunismo
A Câmara Municipal de São Carlos (SP) aprovou um Projeto de Lei (PL) formalizando um termo de colaboração entre a Prefeitura Municipal e a Organização da Sociedade Civil (OSC) de entidade privada, Instituto Angelim. O PL, que foi votado no último dia 8 de outubro, foi encaminhado à Câmara em junho de 2024, após a tramitação desde março, e aprovado recentemente após diversas correções.
Em São Carlos, as políticas públicas para as mulheres – voltadas à promoção e defesa de direitos e combate à violência – vêm sofrendo desmonte, e passam por um processo de privatização e terceirização.
Com a aprovação deste PL, a OSC em questão passará a ter um repasse financeiro da Prefeitura de mais de 500 mil reais ao longo de 12 meses para execução do Projeto “Centro Especializado de Atendimento à Mulher do Sistema Único de Assistência Social – CEAM- SUAS” e sua implantação no município. Há algumas evidências apontadas em sessão ordinária da Câmara Municipal que colocam em dúvida a seriedade do credenciamento do Instituto Angelim, como por exemplo, a ligação direta da coordenadora da entidade com o atual secretário de comunicação do governo, que são casados. Além disso, foi colocada a questão do custo do projeto ser maior que o custo de manutenção dos servidores públicos.
Desse modo, está ocorrendo a terceirização de um equipamento pertencente ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS), sendo o Centro Especializado de Atendimento à Mulher (CRM) responsável por ofertar acolhimento e atendimento interdisciplinar às mulheres em situação de violência de gênero. O Instituto Angelim, ligado à conglomerados privatistas que relacionam-se diretamente com o grande empresariado de São Carlos, há tempos vem disputando as pautas ‘feministas’ em nosso município. Ademais, o mesmo instrumentaliza a pauta de proteção às mulheres e trata o convênio privatista como uma proposta inovadora, alegando que irá colaborar para a instituição de compromissos e serviços de atendimento às mulheres que são de responsabilidade do Governo Municipal.
Sabemos o modo de operar perverso das terceirizações sobre serviços públicos e também que são consequências diretamente relacionadas à medidas de controle fiscal como a Lei de Responsabilidade Fiscal e Austeridade Fiscal iniciadas na década de 90 no Brasil, pelo governo Fernando Henrique Cardoso, aprofundadas no governo Temer e Bolsonaro e mantidas e fortalecidas pelo Governo Lula-Alckmin.
No âmbito da Assistência Social, a qual sofre desmonte e subfinanciamento desde que foi instituída, seus trabalhadores enfrentam muita dificuldade devido à falta de recursos necessários, sucateamento e salários baixos. A terceirização vem como uma alternativa tentadora, mas revela a redução de custos em um campo que já tem escassez e uma exploração de maior trabalho pelo capital. Como consequência, promove a eliminação de postos de trabalho e, com isso, do direito ao ingresso por concurso público, desestimula o contato e fortalecimento de vínculo entre quem efetivamente presta o serviço e os usuários, entre outros desfechos negativos perceptíveis à realidade de trabalhadores prestadores de serviços públicos e usuários.
Em uma carta pública divulgada no dia 09 de outubro, uma servidora pública respondeu ao debate realizado na 33ª Sessão Ordinária da Câmara Municipal. Em sua carta, ela busca justificar o porquê o projeto de terceirização do CEAM poderia ser bom nos termos que se apresentam.
Na realidade, a terceirização compromete a qualidade do serviço público e sua aceitação sob a égide de um “mal menor”, ou mais explicitamente, “melhor um CEAM terceirizado do que a inexistência de Centro de Referência da Mulher – CRM”, não se justifica. Apesar do CEAM ser tipificado como serviço do SUAS, diferentemente do CRM que integra uma política especializada da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, sua abertura sob contrato de terceirização não deve ser aceita.
Tais argumentos retóricos, justificando esse projeto político de redução do Estado, contrariam a própria Lei Orgânica da Assistência Social. Em seu artigo 5°, está colocado que deve ser priorizada a responsabilidade do Estado na condução da política de assistência social do Governo (em todas suas esferas). Precisamos, enquanto classe trabalhadora são carlense, nos mobilizar e organizar ações contra a agressão que está prestes a ser concretizada contra os trabalhadores e trabalhadoras, nos fazendo aceitar condições de impossibilidade de pertencimento, redução de direitos trabalhistas, precariedade de vínculo, maior invisibilização e má remuneração de trabalhos que são exercidos majoritariamente por mulheres na saúde e assistência social.
Meninas e mulheres vítimas de violência estão restringidas de acesso a políticas públicas, por conta da retração dos serviços sociais públicos. O impacto estende-se à precarização e vulnerabilização também das trabalhadoras. Um CEAM é norteado por uma estrutura nacional, enquanto um CRM por um organismo de política pública municipal ou estadual. Ambos equipamentos são importantes, mas independente de por onde será aplicada a política, ela deverá ser de administração pública,estando sob controle popular de fato.
O PCBR reivindica, como parte integrante da luta feminista em São Carlos, arranjos sociais trabalhistas que priorizem a vida das pessoas e os vínculos. Por um município que não se renda aos interesses imediatos dos investidores privados e não compactue com políticas de austeridade que impactam diretamente às populações mais vulneráveis.