Prefeitura tenta aprovar escolas cívico-militares na cidade
20/11/2019A Câmara Municipal de São Carlos abriu consulta pública sobre a possibilidade de adesão ao Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares (PECIM). Segundo o documento, já foi oficializado interesse em aderir ao programa utilizando as dependências da E.M.E.B. Névio Dias, localizada no Cidade Aracy II. A consulta se encerra no dia 26 de novembro e pode ser realizada no site http://www.consultapublica.com.br/index.jsp?id=15
O PECIM é um programa do governo federal, lançado em setembro deste ano, e tem como objetivo a implantação de 216 escolas cívico-militares até 2023. Entre os argumentos para tal medida, está o melhor desempenho das escolas cívico-militares em comparação com as civis no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), além de menores taxas de evasão e de reprovação. No entanto, é preciso fazer uma análise cuidadosa dos dados antes de atribuir o sucesso dessas escolas à disciplina militar.
Pesquisadores em educação atribuem o sucesso das escolas cívico-militares em indicadores educacionais à melhor estrutura e ao perfil socioeconômico elevado de seus estudantes, não à militarização em si. De fato, nos 13 colégios cívico-militares mantidos pelo exército no país, o investimento médio anual por aluno é de 19 mil reais, mais que o triplo do investido em um aluno de escola pública regular, que é de 6 mil. Além disso, a maioria dos estudantes dessas instituições são filhos de militares, enquanto o restante precisa passar por processos seletivos bastante concorridos, que no caso do Colégio Militar do Rio, chegaram a lotar o Maracanã. Tais fatores são determinantes para o perfil socioeconômico dos alunos: segundo o INEP, em 2014, das 59 escolas cívico-militares estaduais, apenas uma, em Goiás, possuía indicador de perfil socioeconômico médio baixo enquanto 18 possuíam indicador muito alto e outras 18 com indicador alto.
Segundo o MEC, foi encomendada uma pesquisa realizada pelo Instituto Checon em todos os estados e no Distrito Federal para avaliar as escolas militares, chegando a uma nota geral obtida após notas individuais para parâmetros como segurança e ensino. Porém os dados dessa pesquisa não foram divulgados pelo Instituto e não se encontram disponíveis para público em lugar algum. O MEC apenas divulgou, no lançamento do programa, a nota geral (8,3) e de cinco desses parâmetros, todos com notas inferiores ou iguais à média geral, gerando insegurança quanto à consistência dos dados.
Outro ponto que corrobora com a tese de que não é a militarização que garante os bons resultados são as escolas civis federais, que possuem um investimento menor que os dos colégios militares, de 16 mil por aluno, mas que figuram em sete das dez melhores posições no ranking de escolas públicas no ENEM. Por fim, mas não menos importante, precisamos pensar em que tipo de cidadãos queremos que nossas escolas formem. A hierarquia militar não oferece abertura ao diálogo e, na prática, disciplina os alunos pelo medo, não pelo respeito, forjando cidadãos acríticos e sem autonomia.
Todos queremos escolas organizadas, seguras e com ensino de qualidade. Porém não é preciso abrir mão da liberdade e do pensamento crítico para construí-las. Em vez disso, é preciso aumentar o investimento por aluno e trabalhar na formação de professores, além de discutir novos modelos de escola. É necessário pensar em projetos pedagógicos interdisciplinares e reformular o currículo a fim de desenvolver uma educação crítica e atual, voltada para o século XXI. A escola que queremos não será construída com medo e hierarquia militar.
Créditos da foto: Dênio Simões/Agência Brasília