Chuvas no Aracê e o caos ambiental em São Carlos

Chuvas no Aracê e o caos ambiental em São Carlos

20/01/2022 Off Por Colaborador/a

Por Beatriz França, Zenem e Beatrice Volpato — militantes do PCB São Carlos.

Na tarde da última quinta-feira, os moradores e moradoras do bairro Aracê de Santo Antônio viram suas casas sendo tomadas pela força das águas. Com as chuvas de janeiro, tipicamente mais fortes e numerosas, a ocorrência destes problemas em São Carlos se intensifica. Desta vez, foram as ruas do Aracê que ficaram intransitáveis, arrastaram carros e causaram transtornos para os moradores que voltavam do trabalho.

Esse problema ocorreu fundamentalmente porque há uma lagoa de retenção de águas construída nas proximidades que, com a chuva excessiva, transbordou. Os moradores do bairro, cientes dessa possibilidade, já haviam contatado a prefeitura, vereadores e outros órgãos públicos, mas nenhuma atitude foi tomada.

Para além do problema específico do transbordamento da lagoa de retenção, precisamos entender tal situação num quadro maior. Por isso, nos perguntamos: por que, nos últimos anos, as chuvas estão aumentando e ocasionando tantos estragos em nossa cidade?

Em relação ao aumento das chuvas, a primeira resposta é o aquecimento em nosso planeta em decorrência da devastação e da poluição ambiental. Vivemos em um sistema capitalista que tem como regra uma pequena classe de ricos e proprietários estar sempre buscando acumular maiores e maiores quantidades de riquezas. É uma busca incessante por lucros. Nesse acúmulo, além de explorar o trabalho de grande parte da população trabalhadora, os negócios dos ricos avançam abocanhando áreas “naturais” ainda não exploradas. A destruição promovida pelas mineradoras, pelas empresas extrativistas, pelo agronegócios, por grileiros e madeireiros, entre outros, são resultados dessas atividades. Essa destruição dos biomas afeta o clima e a temperatura das regiões planetárias e, em decorrência disso, causa chuvas cada vez mais fortes.

O impacto dessas chuvas é intensificado pela própria destruição das vegetações. São Carlos, por exemplo, teve seu entorno vegetativo em grande parte destruído pelas atividades de extração, como plantação de cana, e no interior da cidade quase não encontramos vegetações significativas. Nesses cenários, as chuvas excessivas encontram pouca resistência e retenção nas vegetações, tendendo a se acumular e deslocar em maiores quantidades e forças nas áreas desmatadas e nos concretos urbanos.

Pautadas por um planejamento urbano que prioriza os interesses do mercado imobiliário e do transporte individual é comum nas cidades brasileiras o processo de impermeabilização do solo e retificação e canalização de rios. Isso faz com que os corpos hídricos não tenham seus percursos naturais e nem sua sazonalidade respeitada e, assim, quando há um regime de chuvas mais intenso, as enchentes tornam-se ainda mais comuns. Essa é uma das causas do grande problema de enchentes no centro de São Carlos, que foi construído bem acima do Córrego do Gregório e seus afluentes e que gera prejuízo todo ano para os comerciantes locais.

Não se deve ignorar que as consequências das más escolhas urbanísticas e do descuido da prefeitura atingem com muito mais força as regiões de moradia da classe trabalhadora e de atividades dos comerciantes locais. Enquanto moradores dos bairros da zona sul (como o Aracy e o CDHU) e os comércios próximos ao mercado municipal sofrem todos os anos com o grande volume de água, os condomínios fechados recém construídos das camadas médias e da classe de proprietários recebem os melhores tratamentos urbanísticos e raramente são castigados com as intempéries cada vez mais constantes e fortes.

A destruição que ocorreu no bairro Aracê não foi algo isolado. Tudo aponta que esse acontecimento, como as anteriores enchentes e destruição no centro e em alguns bairros da cidade, são expressão do caos ambiental o qual a cidade enfrenta. A prefeitura precisa responder a nível local às questões climáticas e atualizar os protocolos de soluções que há muito tempo já se demonstram defasados, ou seja, deixar de combater pontualmente apenas com “piscinões” e lagoas de contenção.

Existem profissionais, conhecimento e dinheiro suficiente para planejar e executar um plano com sistemas de áreas verdes e mitigação das águas pluviais que acompanhe as necessidades dos moradores dos bairros e das questões técnicas, assim como adequar as vias urbanas e garantir acesso à moradia em locais seguros, tudo isso com acompanhamento e participação dos cidadãos são-carlenses.

Apesar de existir ações a curto prazo para minimizar as questões das enchentes, esse problema só será realmente resolvido quando superarmos esse sistema que destrói a natureza e a vida em busca de lucros. A garantia do direito à vida digna a todas e todos, com acesso universal à moradia, saúde, educação, lazer e mobilidade, é incompatível com o sistema capitalista, que necessita da desigualdade para sobreviver.

A política institucional burguesa faz de tudo para sabotar a participação popular ao mesmo tempo que garante a representação do mercado imobiliário, do agronegócio e das grandes indústrias nas tomadas de decisões nos conselhos municipais, na formulação dos planos diretores e leis e na execução de projetos. Sendo assim, a única maneira de assegurar o direito à cidade e a convivência em harmonia com a natureza é por meio da luta política pela superação da sociedade burguesa com a finalidade de construir uma nova sociedade socialista.