Lincoln Rossi e Gon Salves lançam o álbum “Sumário”

Por Flávia Gobato

Os rappers Lincoln Rossi e Gon Salves, ambos de São Carlos (SP), estão prontos para lançar seu mais recente trabalho, o álbum “Sumário”, na sexta-feira, dia 18 de outubro de 2024, em todas as plataformas digitais.

O álbum “Sumário” mergulha no cotidiano do trabalhador brasileiro, com letras que refletem o poder transformador do rap em diversas áreas da vida. Ao longo de 10 faixas, o ouvinte acompanha o desenrolar dos dias e dos questionamentos de Lincoln e Gon Salves, dois amigos que, “sumariando” ideias, conseguiram colocar no papel aquilo que gostariam de compartilhar com o mundo. Entre os destaques do álbum estão as faixas com clipes disponíveis no YouTube: “Esquece”, “Mandinga” e uma homenagem à lenda urbana sãocarlense “A Menina que Dançou com o Diabo”. Além dessas, o disco traz a sensação de quase tragédia na reviravolta da faixa “Art. 306”. Só ouvindo para entender.

Essa é a primeira vez que os conterrâneos trabalham juntos, unindo suas vivências e referências acumuladas ao longo de mais de 20 anos de dedicação à cultura Hip Hop.

Lincoln Rossi, que está ranqueado entre os top 15 beatmakers em um dos maiores desafios de beats do mundo, “The Producer Corner”, também é MC, compositor e produtor desde 2004. Ele é fundador do selo e estúdio “Correra Records” e já colaborou com nomes relevantes do rap nacional, como Sara Donato, Monkey Jhayam, Jô Maloupas e Willian Chacal. Em 2022, Lincoln produziu um álbum completo para o lendário MC norte-americano Krumb Snatcha, da Gang Starr Foundation. Em “Sumário” cumpriu o papel de beatmaker, vocal, produtor e compositor.

Gon Salves, por sua vez, é MC é compositor, também responsável pelas letras e vocais do álbum. Desde 2013, Gon vem construindo uma sólida carreira no rap, com quatro discos lançados e diversos singles que exploram a vida cotidiana, o amor, os valores de suas raízes e o impacto do Hip Hop como filosofia de vida. 

Aproveitamos o ensejo com a dupla e fizemos algumas perguntas sobre o processo de criação do álbum.

Por que o título Sumário?
Resposta (Lincoln): O álbum é totalmente baseado em conversas que nós temos enquanto amigos no dia a dia, e em nossa vida cotidiana, daí vem o nome “Sumário”, que na gíria significa uma troca de ideias, sumariar uma ideias, o que reflete muito bem todo o contexto do álbum

Como surgiu a ideia do disco e como foi o processo de criação?
Resposta (Lincoln): Eu estava fazendo uma beat-tape instrumental apenas com samples de música brasileira, e tive a ideia de adicionar apenas uma música com voz nesse trabalho, seria na base da Mandinga, pois o Gon e eu já havíamos tido algumas ideias de letra em cima dela em outras ocasiões, e então começamos o processo de escrever juntos. Porém, de forma online, eu mandava minha parte por áudio, o Gon respondia com a dele, e assim até escrever todo o som. Isso foi muito rápido, acredito que em uma hora no máximo estávamos com a letra pronta. O processo de gravação também aconteceu muito rápido e acabei gostando muito do resultado, a partir daí resolvi propor para o Gon se ele não topava tentar fazer mais algumas músicas nessa pegada e quem sabe talvez fechar um EP. Assim, demos sequência no processo, que acabou virando um álbum com 10 músicas e acabei deixando de lado a ideia da beat-tape.

A escolha dos samples tem um significado especial em relação às temáticas das músicas? Como foi o processo de seleção?
Resposta (Lincoln): Alguns samples tem um significado especial sim, outros são aleatórios mesmo. O beat pronto é escolhido conforme a temática do som e com o clima que a gente quer passar com aquela música. Na música Sem Rap por exemplo, a gente gravou uma primeira vez ela completa em um beat, eu não estava gostando muito da música no geral, foi quando lembrei que eu tinha um beat já feito com o mesmo sample de uma musica do Sabotage, e propus para o Gon regravar para ver como soava, já que a música fala sobre como seria nossa vida sem Rap e o sample faria essa ligação com os raps clássicos. Regravamos a música uma segunda vez. Passado um tempo, lembrei que eu estava guardando o sample da música Capítulo 4 Versículo 3 do Racionais a um bom tempo para um dia tentar samplear-la, e tive a ideia de fazer isso e colocar essa batida apenas na segunda parte da música, assim a música teria 2 samples de 2 grande clássicos do Rap Nacional, usados de forma diferentes, e assim regravamos todas as vozes dessa música uma terceira vez, para ficar bem no clima que as duas bases propunham, hoje ela é uma das nossas faixas preferidas o álbum.

“A Garota que Dançou com o Diabo” é uma lenda urbana de São Carlos. Já havia uma vontade de fazer uma música sobre isso ou a construção do álbum trouxe essa oportunidade de contar essa história?
Resposta (Lincoln): eu tinha a ideia de fazer essa música a alguns anos já, porém estava com uma certa dificuldade de elaborar a ideia, pois eu não queria que soasse como uma história religiosa ou até mesmo machista. Pelo contrário, queria trazer a lenda para a atualidade de nossos tempos, pois pra mim essa lenda foi inventada como uma forma que os pais daquela época (década de 40 quando ela surge) de proteger seus filhos, principalmente as meninas, dos perigos noturnos e dos perigos masculinos. Na letra eu relaciono a lenda com o feminicídio, e relaciono o “diabo” da história com os homens que cometem tais atos de violência. No processo de elaboração do álbum, consegui elaborar melhor esse roteiro e consegui escrever a letra exatamente como eu queria que soasse. 

Vocês tiveram alguma influência ou referência específica para o álbum? Teve algum artista que o inspirou mais do que outro?
Resposta (Gon Salves): Como venho consumindo muito Rap Chileno essa foi a maior inspiração que tive nos meus processos de composição para esse álbum. E também, o que é muito importante, entender o momento atual. Tudo o que nos rodeia, as melhores formas de lançar e divulgar, para colocar o álbum da melhor forma possível na rua e soar atual e verdadeiro com o que condiz com o nosso momento.

Qual é a expectativa de vocês para o lançamento do álbum?
Resposta (Gon Salves): Estou bastante empolgado com o lançamento, no começo do processo estava pensando em como a rua iria receber e tal, mas no decorrer do processo a gente vai se animando e vendo que a galera vai recebendo bem os lançamentos e também se empolgando e esperando o trabalho sair, e do que jeito que ele tiver que caminhar acredito que ele vai caminhar. Essa não é uma coisa que está muito no nosso controle, então onde tiver que chegar acredito que vai chegar.
Resposta (Lincoln): Também estou bastante empolgado, sem dúvida nenhuma foi o trabalho que a gente melhor soube divulgar e trabalhar o marketing digital e tudo mais, tivemos números muito bons com os singles e clipes que já lançamos dele e acredito que com o álbum completo não será diferente. Tem uma galera esperando o disco e nos cobrando, o que me deixa muito feliz e motivado em colocar esse trampo na rua.

Quais são as diferenças mais marcantes entre Sumário e seus trabalhos anteriores, tanto em termos de som quanto de temática?
Resposta (Gon Salves): Como eu estava vindo de dois EPs de love song, Sumário me deu uma outra direção nas temáticas. Lincoln tem muito essa ideia de músicas temáticas, de falar sobre algo nas letras, e isso acabou me trazendo também para esse contexto e me fez lembrar sobre as músicas do Sub Loco Coletividade, que o Lincoln fez parte. Sempre com músicas temáticas e metafóricas, foi meio que trazer isso novamente com outras ideias, propostas e sonoridade mais atual. Porém, sem deixar de trazer o som que a gente gosta, de fazer e de ouvir, o Boom Bap sempre está presente no nosso trabalho. Estamos confortáveis nos beats produzidos pelo Lincoln, porém ainda assim evoluindo e atento às sonoridades atuais, pra não soar também igual a outros trabalhos nossos, ainda que a gente não saia tanto dessa vertente, explorando samples e outras atmosferas.
Resposta (Lincoln): Eu estava a algum tempo sem escrever, apenas focado em fazer beats para outros MC’s e competições. Sumário reacendeu em mim a vontade de querer escrever e falar algumas coisas e de cantar também novamente, pois também estava a um bom tempo afastado dos microfones nos palcos. A partir daí, minha cabeça começou a criar muitos temas e letras, algumas que inclusive não foram para o disco, mas que nasceram dessa explosão mental, que fazer esse disco com o Gon Salves me proporcionou.

Como vocês percebem a evolução da cena do rap nacional atualmente e como o interior paulista se relaciona com essa cena?
Resposta (Gon Salves):  Eu acho muito boa essa liberdade que o Rap tem hoje, de poder falar sobre qualquer tema, e poder usar das facilidades tecnológicas a seu favor, mas isso não quer dizer que concordo com tudo que tem sido feito e que tudo me agrada, dentro do que a gente gosta e se identifica com a nossa realidade, e identifica com o os fundamentos primordiais do Hip Hop eu gosto e aprovo. E eu acho que o interior tem que se fortalecer mais entre si e parar de querer que a capital enxergue e aprove o que a gente faz. Fazer com que as cidades do interior e dos interiores sejam um elo cada vez mais forte e fazer os seus produtos se fortalecerem entre si, visto que o interior tem uma fonte riquíssima de artistas muito fodas.

Quais são os próximos planos pós-lançamento?
Resposta (Lincoln): Penso em fazer mais algum vídeoclipe de alguma faixa do Sumário pós lançamento e paralelo ao disco continuei meus trabalhos como beatmaker e tenho dois EPs engatilhados para sair, um com o Pimas de Ribeirão Preto e o outro com o Goldman de Guarulhos, ambos com todos beats produzidos por mim, e também já iniciei minha segunda coletânea de beatmaker o Lendas Contemporâneas Vol.2, mas ainda sem previsão para sair.
Resposta (Gon Salves): Eu venho ressignificando um pouco meus sons a medida do possível e estudando muito pra isso. Eu já vinha elaborando alguns trabalhos antes de começar a fazer o Sumário e agora vai ser a hora de retomá-los e ver a melhor forma de conduzi-los para lançarmos. Pretendo também rodar os slams e voltar a trabalhar minhas poesias, pois é um lugar bom de estar e minha arte transita muito bem por lá.

Como vocês dois veem a falta de investimento em cultura no Brasil e em São Carlos, levando em conta a existência de políticas como a do Novo Teto de Gastos, que retira  investimento em setores chave para a população (como saúde, educação e cultura)?
Resposta (Lincoln): Acho lamentável, tanto no âmbito municipal, como no federal, pois acredito que a cultura tem total potencial para contribuir com questões chave no desenvolvimento da sociedade, e dos seres humanos. O investimento que existe acho muito baixo e às vezes me parece que é só para cumprir tabela, e quando existe contemplados acaba não refletindo o que realmente está em exercício na comunidade.
Resposta (Gon Salves): Estamos vindo de duas gestões que não se moveram para melhorar o incentivo a cultura em São Carlos, e vamos ter mais quatro anos desse mesmo sistema, infelizmente é o que o povo escolheu, pra nós o que resta é se frustrar e seguir fazendo o que a gente faz e o que a gente tem feito, independente de quem esteja no poder, dentro da nossa realidade e do nosso possível.

Portanto, não se esqueça: “Sumário” estará disponível no dia 18 de outubro, a partir das 00:00, nas principais plataformas digitais, entre elas Spotify, Deezer, YouTube, Apple Music e demais.

Playlist de videoclipes: Lincoln Rossi e Gon Salves – 08 – Mandinga (Videoclipe)