40 famílias recebem ordem injusta de despejo de condomínio na zona rural de São Carlos

40 famílias recebem ordem injusta de despejo de condomínio na zona rural de São Carlos

13/10/2019 Off Por Editorial Tribuna São Carlense

A Justiça deliberou o despejo de cerca de 40 famílias do Recanto das Oliveiras, condomínio na área rural sãocarlense, com a alegação de que os loteamentos estão situados em área de preservação ambiental.

A decisão da Justiça se deu em resposta à ação do Ministério Público contra os moradores da região em 2007. A promotoria na época argumentava que as terras não eram propriedade dos atuais moradores, e que os habitantes do local usavam o espaço como área recreativa, ou seja, de passeio, o que não é verdade. As casas do condomínio servem de moradia para a população, e muitos desses moradores sobrevivem do que conseguem produzir na sua propriedade, com animais, hortas, fabricação de queijo e outros.

Seu Luiz e sua plantação

Mais de 10 anos depois, com a atual promotoria de Flávio Okamoto, a justificativa do despejo está na situação irregular do terreno. De acordo com a acusação, as habitações foram construídas na área de preservação ambiental da Fazenda Tupi, propriedade comprada por Airton Garcia, prefeito de São Carlos, em 2006. A promotoria tem tratado a situação como um caso de invasão de terra.

Indignada com as acusações, a comunidade do Recanto das Oliveiras, afirma ter comprado e pago por todas as propriedades em que moram. As compras foram feitas no início dos anos 2000, com Aparecida Schmidt, que se apresentava como proprietária do terreno e com a autorização da promotoria da época, de Edward Ferreira Filho. Os moradores têm a documentação de compra e o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinada por Edward, que autorizava a permanência da população no local, mas nunca receberam as escrituras dos terrenos. “Nós temos autorização de um promotor para [a terra] ser comercializada. Compramos e pagamos. E um outro promotor dizendo que invadimos, que essa área não é nossa, que alguém se apropriou dela. E agora quer nos tirar daqui.”, afirmou Silvani Ferreira Gomes, morador da região há 19 anos. E continua: “se fosse ilegal e invadida como eles estão falando, a companhia paulista por exemplo tinha ligado a energia aqui? a prefeitura tinha colocado ônibus para buscar as crianças?”

Seu Zé e suas bananeiras

Além disso, na época em que adquiriram o terreno, o espaço não se configurava como área de preservação ambiental. Somente alguns anos depois de firmado o acordo de venda entre as partes, que a Justiça delimitou o restante do terreno que estava no nome dos vendedores (família Schmidt) deveria ser considerado reserva legal e preservado de acordo com um documento, firmado em 2003.

Quase 20 anos vivendo no local, a população do Recanto está em prantos. Muitos sobrevivem da terra, levaram anos para construir suas casas e tem uma relação de amor e cuidado pelo campo. Estão dispostos a negociar com o Ministério Público, mas a Justiça já se posicionou afirmando que a existência daquela comunidade é um ataque ao meio ambiente.

Horta do Seu Zé

No entanto, é curioso que a região do Recanto das Oliveiras está próxima à terrenos de empresas como Volkswagen, Sobloco, além do posto Graal e Castelo, que não configuram como parte da área a ser preservada, mas geram mais impacto negativo ao meio ambiente com a quantidade de lixo que produzem e jogam na região, do que a presença daquela população, que pelo contrário, tem ajudado a conservar a terra. “Quando nós mudamos, aqui tinha quatro nascentes, a coisa mais linda, quatro represas. Eles começaram a plantar eucalipto e acabou, virou só areia. É nós que estamos acabando com o meio ambiente? Será que 40 famílias tá acabando com o meio ambiente mais do que uma fazenda dessa de eucalipto? Mais do que uma rede de posto que tem aqui? Então assim, tem algo errado, se tem que tirar, tira todo mundo”, disseram os moradores.

Segundo os moradores, na época em que se mudaram, todo o terreno do loteamento era um “areião”. “Todo ano pegava fogo aqui, depois que os moradores vieram nunca mais pegou fogo”, argumenta Moacir Ferreira, outro habitante do condomínio. A comunidade defende que sempre cuidou do espaço, e que se propõe a tratar dos outros 100 alqueires, que não habitam, caso a Justiça permita a presença dos moradores no local e aceite um acordo.

Dona Judite na estufa da sua moradia

Na determinação judicial, apenas 9 famílias de 40, irão receber algum tipo de assistência e inclusão no programa habitacional do município. “Os moradores daqui não querem ser incluídos num programa habitacional, todos sem exceção querem ficar aqui”, dizem os moradores. O restante das pessoas, caso o processo não seja retirado, passarão a ser famílias sem-terra. Além disso, terão suas propriedades demolidas e animais retirados das chácaras e levados pela Prefeitura, ainda que o processo se dê sobre a posse da terra.

Depois da demolição, os lotes devem voltar para a posse de Airton Garcia, que já se posicionou dizendo que não quer arcar com os custos de reflorestamento. Ou seja, não há garantia de que a área será preservada, caso os habitantes sejam expulsos. Ademais, não existe nenhuma perspectiva de indenização aos moradores, que foram autorizados a construir suas casas pela mesma Justiça no começo dos anos 2000. Para Moacir “o ambiente tem que ser respeitado, mas o ser humano também tem que respeitar o ser humano, não é trocar os humanos pelo meio ambiente”.